terça-feira, 3 de novembro de 2009

Amemos o irregular, o inesperado, o inseguro, o ondulante,

o flexível, o pretensamente frívolo. Permaneçamos curiosos,

e até vivamos por curiosidade. Avancemos algumas vezes a

ignorância e desconfiemos dos pregadores da verdade.

A Verdade maiúscula é o paradigma das nossas ilusões.

Só podemos pretender algumas pequenas verdades de

passagem, rapidamente declaradas, sempre discutidas,

frequentemente esquecidas. Devemos preservar nossa

fragilidade como devemos salvar o inútil. A fragilidade

nos aproxima uns dos outros e o inútil nos permite a

evasão, é a nossa saída de emergência.



Jean Claude Carrière

Vasily Surikov


Saudades! Sim... talvez... e porque não?...
Se o nosso sonho foi tão alto e forte
Que bem pensara vê-lo até à morte
Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?... Ah! como é vão!
Que tudo isso, Amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte
Deve-nos ser sagrado como pão!

Quantas vezes, Amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar,
Mais doidamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais a saudade andasse presa a mim!



Florbela Espanca

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Edward Hopper


Quando abro a cada manhã a janela do meu quarto

É como se abrisse o mesmo livro

Numa página nova...


Mário Quintana

Loretta Lux


O "eu" manifesta-se pouco fora das circunstâncias.

Eu sou, eu existo nesta contingência misturada que

muda, muda pela tempestade do outro, por sua

possibilidade de existir. Nós nos colocamods um e

outro, em afastamento do estável, no arriscado.

No auge saturado da mistura, o êxtase da existência

é uma soma tornada possível pela contingência do

outro. Minha contingência torna possível a mesma

descoberta para ele. Essa experiência de corpos

misturados, dessas multiplicidades atenuadas

compõem a vida.


MICHEL SERRES