quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Poesia, a minha velha amiga...
eu entrego-lhe tudo

a que os outros não dão importância nenhuma...

a saber:

o silêncio dos velhos corredores

uma esquina

uma lua

(porque há muitas, muitas luas...)

o primeiro olhar daquela primeira namorada

que ainda ilumina, ó alma,

como uma tênue luz de lamparina,

a tua câmara de horrores.

E os grilos?

Sim, os grilos...

Os grilos são os poetas mortos.



Entrego-lhe grilos aos milhões, um lápis verde, um retrato

amarelecido, um velho ovo de costura. 

Os teus pecados, 

as reivindicações, as explicações – 

menos o dar de ombros e os risos contidos

mas todas as lágrimas que o orgulho estancou na fonte

as explosões de cólera

o ranger dos dentes

as alegrias agudas até o grito

a dança dos ossos



Pois bem, às vezes

de tudo quanto lhe entrego, a Poesia faz uma coisa que

Parece nada tem a ver com os ingredientes mas que

Tem por isso mesmo um sabor total:
eternamente
esse gosto de nunca e de sempre.
 

Mário Quintana



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