segunda-feira, 10 de setembro de 2012

A um soldado de sua guarda, exausto e alquebrado, que veio pela rua pedir-lhe permissão
para se matar, César respondeu gracejando ao notar sua aparência decrépita:
"Pensas então que estás vivo?". Se caíssemos de repente nesse estado, não creio que
seríamos capazes de suportar tal mudança. Mas conduzidos pela mão da natureza,
por uma suave ladeira e como que insensível, pouco a pouco, de degrau em degrau nos
envolvemos nesse estado miserável a que nos acostumamos, assim como não sentimos
nenhum abalo quando a juventude morre dentro de nós, o que, no fundo e na verdade,
é a morte mais dura que a morte completa de uma vida languescente e que a morte
da velhice. Tanto mais que o salto do mal existir para o não existir não é tão árduo
como aquele de uma existência suave e florescente para uma existência penosa e dolorosa.
O corpo encurvado e dobrado tem menos força para suportar um fardo, nossa alma também.
É preciso treiná-la e educá-la contra o esforço desse adversário.
Pois, como é impossível que encontre o descanso enquanto o temer, caso se fortaleça
pode se vangloriar (o que é coisa que ultrapassa a condição humana) de ser impossível
que nela se alojem a inquietação, o tormento e o medo, e até a mínima insatisfação.


MONTAIGNE

Nenhum comentário:

Postar um comentário