quarta-feira, 14 de outubro de 2009

O olhar desloca-se para as rosas que estão
em primeiro plano, como se tivessem sido acabadas
de colher. A mulher, porém, tem outras
flores na mão; e obriga-nos a hesitar entre o pote
de onde nascem as rosas e o colo em que pousam
as flores. Trata-se de uma hesitação breve, porque logo
o seu rosto leva-nos a divagar acerca da paisagem.
Vemo-la ao fundo, num semicírculo que tem a
forma perfeita do seio que o vestido esconde, e se poderia
confundir com uma visão do paraíso se
a mulher nos aparecesse como um anjo. Mas
não tem asas; e o seu corpo empurra para longe
a transcendência, mesmo que o seu rostos e perca
numa vaga tristeza que as flores caídas acentuam.
No entanto, se em vez desse mórbido acento me fixar
no brilho das primeiras rosas, posso transferir a cor das
pétalaspara cada uma das faces, e ela levantar-se-á
com uma pose de anjo, transformando
a paisagem, ao fundo, na imagem do paraíso.


Nuno Júdice

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