quinta-feira, 19 de novembro de 2009

"O amor, pelo contrário, nos une às coisas, ainda que
passageiramente. Pergunte-se o leitor que novo caráter
sobrevém a uma coisa quando sobre ela se derrama a
qualidade amada. Que sentimos quando amamos a
mulher, quando amamos a ciência, quando amamos
a pátria? Antes de qualquer outra nota acha­remos
esta: o que dizemos amar se nos apresenta como
algo imprescindível. O amado é, de pronto, o que nos
parece imprescindível. Imprescindível! Quer dizer que
não podemos viver sem ele, que não podemos admitir
uma vida na qual nós existíssemos e o amado não
-que o consideramos parte de nós mesmos-.
Há, por conseguinte, no amor, uma ampliação da
individualidade que absorve outras coisas dentro desta,
que as funde conosco. Tal liame e compenetração nos
levam a internar-nos profundamente nas propriedades
do amado. Vemo-lo inteiros e se nos revela em to­do
seu valor. Então advertimos que o amado é, por sua
vez, parte de outra coisa, que necessita dela e a ela
está ligado. Imprescindível ao amado, também se faz
imprescindível para nós. Deste modo vai ligando o
amor coisa a coisa e tudo conosco, em firme estrutura
essencial. O amor é um divino arquiteto que baixou ao
mundo -segundo Platão,
“ a fim de que todo o universo viva em conexão”.





José Ortega e Gasset - Meditações do Quixote

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